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Uma Marcha De Reis
Morgan Rice


Anel Do Feiticeiro #2
UMA MARCHA DE REIS nos leva um passo adiante na jornada épica de Thor à sua maturidade, quando ele começa a discernir mais sobre quem ele é, quais são seus poderes, quando ele embarca para se tornar um guerreiro. Depois de escapar do calabouço, Thor fica horrorizado ao saber de outra tentativa de assassinato ao Rei MacGil. Quando MacGil morre, o reino entra em um caos total. Como todos competem pelo trono, na Corte do Rei abundam mais do que nunca: os dramas familiares, as lutas pelo poder, ambição, inveja, violência e traições. Um herdeiro deve ser escolhido de entre os filhos e a antiga Espada do Destino, a fonte de toda a sua energia, dará a chance de ser erguida por alguém novo. Mas tudo isso pode ser derrubado: a arma do crime é recuperada e o cerco se fecha em torno do assassino. Simultaneamente, os MacGils enfrentam uma nova ameaça por parte dos McClouds, que se preparam para atacar novamente no Anel. Thor luta para reconquistar o amor de Gwendolyn, porém talvez não haja tempo: ele recebe a ordem de empacotar suas coisas, e preparar-se com seus camaradas para O Centenar: cem dias esgotantes do inferno ao qual devem sobreviver todos os membros da Legião. A Legião terá de atravessar o desfiladeiro mais além da proteção do Anel, entrar na selva, navegar pelo Mar Tartúvio, até a Ilha da Névoa – da qual dizem que é patrulhada por um dragão – para sua iniciação à maturidade.





Morgan Rice

UMA MARCHA DE REIS (LIVRO #2 O ANEL DO FEITICEIRO)




Sobre Morgan Rice

Morgan Rice é a autora do best-seller #1 DIÁRIOS DE VAMPIROS, uma série destinada a jovens adultos composta por onze livros (mais em progresso); da série de Best-seller #1 – TRILOGIA DE SOBREVIVÊNCIA, um thriller pós-apocalíptico que compreende dois livros (outro será adicionado); a série número um de vendas, O ANEL DO FEITICEIRO, composta por treze livros de fantasia épica (outros serão acrescentados).



Os livros de Morgan estão disponíveis em áudio e página impressa e suas traduções estão disponíveis em: alemão, francês, italiano, espanhol, português, japonês, chinês, sueco, holandês, turco, húngaro, checo e eslovaco (em breve estarão disponíveis em mais idiomas).



Morgan apreciará muitíssimo seus comentários, por favor, fique à vontade para visitar www.morganricebooks.com (http://www.morganricebooks.com/) faça parte de nosso newsletter, receba um livro gratuito, ganhe brindes, baixe nosso aplicativo gratuito, obtenha as novidades exclusivas em primeira mão, conecte-se ao Facebook e Twitter, permaneça em contato!



CrГ­tica aclamada sobre Morgan Rice

“O ANEL DO FEITICEIRO reúne todos os ingredientes para um sucesso instantâneo: tramas, intrigas, mistério, bravos cavaleiros e florescentes relacionamentos repletos de corações partidos, decepções e traições. O livro manterá o leitor entretido por horas e agradará a pessoas de todas as idades. Recomendado para fazer parte da biblioteca permanente de todos os leitores do gênero de fantasia.”

–-Books and Movie Reviews, Roberto Mattos.



“Rice faz um trabalho magnífico ao atrair você para a história desde o início, utilizando uma grande qualidade descritiva que transcende a mera imagem do cenário… Muito bem escrito e de uma leitura extremamente rápida.”

–-Black Lagoon Reviews (referindo-se a Turned)



“Uma história ideal para jovens leitores. Morgan Rice fez um bom trabalho, dando uma interessante reviravolta na trama… Refrescante e original. As séries giram em torno de uma garota… Uma jovem extraordinária!… Fácil de ler, mas com um ritmo de leitura extremamente acelerado… Classificação10 pelo MJ/DEJUS.”

–-The Romance Reviews (referindo-se a Turned)



“Captou a minha atenção desde o início e eu não pude soltá-lo… Esta é uma história de aventura incrível que combina agilidade e ação desde o início. Você não encontrará nela nenhum momento maçante.”

–-Paranormal Romance Guild (referindo-se a Turned)



“Carregado de ação, romance, aventura e suspense. Ponha suas mãos nele e apaixone-se novamente.”

–-Vampirebooksite.com (referindo-se a Turned)



“Uma ótima trama, este é especialmente o tipo de livro que lhe dará trabalho soltar à noite. O final é tão intrigante e espetacular que fará com que você queira comprar imediatamente o livro seguinte, só para ver o que acontecerá.”

–-The Dallas Examiner (referindo-se a Loved)



“Um livro que é um rival digno de CREPÚSCULO (TWILIGHT) e AS CRÔNICAS VAMPIRESCAS (VAMPIRE DIARIES) e que fará com que você deseje continuar lendo sem parar até a última página! Se você curte aventura, amor e vampiros este é o livro ideal para você!”

–-Vampirebooksite.com (referindo-se a Turned)



“Morgan Rice mais uma vez mostra ser uma narradora extremamente talentosa… Esta narrativa atrairá uma grande variedade de público, incluindo os fãs mais jovens do gênero vampiro/fantasia. Terminou com uma situação de suspense tão inesperada que o deixará chocado.”

–-The Romance Reviews (referindo-se a Loved)



Livros de Morgan Rice




O ANEL DO FEITICEIRO


EM BUSCA DE HERГ“IS (Livro #1)


UMA MARCHA DE REIS (Livro #2)


UM DESTINO DE DRAGГ•ES (Livro #3)


UM GRITO DE HONRA (Livro #4)


UM VOTO DE GLГ“RIA (Livro #5)


UMA CARGA DE VALOR (Livro #6)


UM RITO DE ESPADAS (Livro #7)


UM ESCUDO DE ARMAS (Livro #8)


UM CÉU DE FEITIÇOS (Livro #9)


UM MAR DE ESCUDOS (Livro #10)


UM REINADO DE AÇO (Livro #11)


UMA TERRA DE FOGO (Livro #12)


UM GOVERNO DE RAINHAS (Livro #13)




TRILOGIA DE SOBREVIVГЉNCIA


ARENA UM: TRAFICANTES DE ESCRAVOS (Livro #1)


ARENA DOIS (Livro #2)




DIГЃRIOS DE UM VAMPIRO


TRANSFORMADA (Livro #1)


AMADA (Livro #2)


TRAГЌDA (Livro #3)


DESTINADA (Livro #4)


DESEJADA (Livro #5)


PROMETIDA EM CASAMENTO (Livro #6)


JURADA (Livro #7)


ENCONTRADA (Livro #8)


RESSUSCITADA (Livro #9)


SUPLICADA (Livro #10)


DESTINADA (Livro #11)












Ouça (http://www.amazon.com/Quest-Heroes-Book-Sorcerers-Ring/dp/B00F9VJRXG/ref=la_B004KYW5SW_1_13_title_0_main?s=books&ie=UTF8&qid=1379619328&sr=1-13) a série O ANEL DO FEITICEIRO em formato audiobook!




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iTunes (https://itunes.apple.com/us/audiobook/quest-heroes-book-1-in-sorcerers/id710447409)


Copyright В© Morgan Rice 2013



Todos os direitos reservados. Exceto os permitidos, sujeitos à Lei de direitos autorais dos Estados Unidos de 1976, nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida; distribuída; ou transmitida, em qualquer forma ou por qualquer meio; ou armazenada em um banco de dados ou sistema de recuperação, sem a prévia autorização da autora.



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Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, empresas, organizações, lugares, eventos e incidentes ou são o produto da imaginação da autora ou são utilizados ficcionalmente. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas, é mera coincidência.



A imagem de capa é de  Bilibin Maksym e usada sob licença da Shutterstock.com.


“Será um punhal o que vejo diante de mim,
com o cabo voltado para a minha mГЈo? Deixe-me apanhГЎ-lo.
Não o apanhei ainda; no entanto ainda o vejo… ”

    —William Shakespeare
В В В В Macbeth






CAPГЌTULO UM


O Rei entrou aos tropeções em seus aposentos privados, o quarto girava e sua cabeça martelava sofrendo devido aos excessos com a bebida e às festividades da noite. Uma mulher cujo nome ele desconhecia agarrava-se a ele passando um braço por sua cintura, com sua blusa já quase removida, ela o levava com uma risadinha em direção a sua cama. Dois servos fecharam a porta detrás deles e desapareceram discretamente.

MacGil Não sabia onde estava sua rainha e nessa noite ele não se importava. Eles raramente compartilhavam o leito conjugal – com frequência, ela se retirava para seus aposentos privados, especialmente nas noites de festas, quando os banquetes se prolongavam muito. Ela sabia das indiscrições do marido e isso parecia não importar-lhe. Depois de tudo, ele era o rei e os reis MacGil sempre tinham governado fazendo pleno uso de seus privilégios.

PorГ©m quando MacGil voltou-se para a cama ele sentiu o quarto dar voltas ainda mais rapidamente e repentinamente se desvencilhou da mulher. Ele jГЎ nГЈo estava mais a fim de estar com ela.

“Deixe-me só!” Ordenou ele afastando-a.

A mulher ficou parada ali entre surpresa e ofendida, então a porta foi aberta e os servos regressaram. Cada um deles tomou-a por um braço e ambos levaram-na para fora. Ela protestou, mas seus gritos logo foram abafados quando os servos fecharam a porta atrás dela.

MacGil sentou-se na borda da cama e descansou a cabeça em suas mãos, tentando fazer sua dor de cabeça parar. Não era comum que ele tivesse uma dor de cabeça assim tão cedo, antes que a bebida fizesse efeito, porém essa noite era diferente. Tudo havia mudado tão rapidamente; a festa tinha corrido tão bem; ele tinha sido servido com uma das carnes mais seletas e um vinho excelente quando aquele rapaz, Thor, tinha surgido e arruinado tudo. Primeiro foi sua intrusão, com aquele sonho bobo; logo, ele teve a audácia de derrubar o cálice das suas mãos.

Então aquele cão tinha de aparecer, lamber o vinho e cair morto na frente de todo o mundo. MacGil tinha estado perturbado desde aquele momento. A revelação o havia golpeado como um martelo: alguém tinha tentado envenená-lo; tentado assassiná-lo. Ele dificilmente poderia entender isso. Alguém tinha escapado de seus guardas, tinha passado pelos seus copeiros e provadores reais. Ele tinha estado a uma fração de segundo de distância da morte e isso o deixou completamente abalado.

Ele lembrou-se de ter visto Thor sendo levado para o calabouço e perguntou-se novamente se essa tinha sido uma ordem acertada. Por um lado, estava claro que não havia maneira de que o rapaz soubesse que o cálice estava envenenado se ele mesmo não tivesse colocado o veneno na bebida, ou de alguma maneira não fosse cúmplice do crime. Por outro lado, ele sabia que Thor tinha poderes profundos e misteriosos – muito misteriosos – e talvez ele tivesse dito a verdade: talvez ele tivesse mesmo tido uma visão em um sonho. Talvez Thor tivesse, de fato, salvado sua vida e talvez MacGil tivesse enviado para a masmorra uma pessoa verdadeiramente leal.

A cabeça de MacGil martelava com esses pensamentos enquanto ele permanecia ali sentado, esfregando a testa marcada, tentando resolver tudo. Mas ele tinha bebido demais nessa noite, sua mente estava muito entorpecida, seus pensamentos giravam em um turbilhão e ele sentia-se incapaz de chegar ao fundo de tudo. Fazia muito calor ali, era uma noite de verão abafada, seu corpo estava acalorado pelas horas de indulgência em comida e bebida e ele estava banhado de suor.

Ele estendeu a mão tirou seu manto, logo a camisa exterior e despiu-se para ficar apenas com uma camiseta. Ele limpou o suor da sua fronte e logo de sua barba. Logo, ele inclinou-se e tirou suas enormes e pesadas botas, uma de cada vez e enroscou os dedos dos pés ao sentir o ar atingi-los. Ele permaneceu sentado ali e respirava pesadamente, tentando recuperar o seu equilíbrio. Sua barriga tinha crescido hoje e lhe causava incômodo. Ele jogou as pernas para cima e deitou-se, descansando a cabeça no travesseiro. Ele suspirou e olhou para cima, para além dos quatro, postes, olhou para o teto e desejou que o quarto parasse de girar.

Quem iria querer me matar? Ele se perguntou, mais uma vez. Ele havia amado Thor como um filho e uma parte dele sentia que não podia ser o rapaz. Ele tentava imaginar quem mais poderia ser; que motivo poderia ter – e o mais importante: se tentariam assassiná-lo novamente. Ele estaria a salvo? Estariam certas as previsões de Argon?

MacGil sentiu seus olhos ficarem mais pesados ao perceber que a resposta estava além do alcance de sua compreensão. Se sua mente estivesse apenas um pouco mais clara, talvez ele pudesse esclarecer tudo. Mas ele teria de esperar pela luz da manhã para convocar seus conselheiros, para iniciar uma investigação. A pergunta em sua mente não era quem o queria morto – mas quem não o queria morto. Sua corte estava cheia de pessoas que cobiçavam seu trono. Generais ambiciosos; conselheiros manipuladores; nobres e lordes ávidos de poder; espiões; velhos rivais; assassinos do clã McClouds— e talvez até mesmo dos Selvagens. Talvez até mais perto do que isso.

Os olhos de MacGil piscaram quando ele começou a cair no sono, mas algo chamou sua atenção e ele os manteve abertos. Ele detectou um movimento e olhou para ver se os seus assistentes estavam ali. Ele piscou confuso. Seus assistentes nunca o deixavam sozinho. Na verdade, ele não podia lembrar quando havia sido a última vez que ele esteve sozinho naquele quarto. Ele não se lembrava de ter ordenado que o deixassem sozinho. E ainda mais estranho era o fato de que a porta de seu quarto estava completamente aberta.

Nesse mesmo instante MacGil ouviu um barulho que provinha de um canto distante do quarto, então ele virou-se e olhou. Ali, esgueirando-se ao longo da parede, vindo desde as sombras e iluminado pela luz das tochas, havia um homem alto e magro, vestindo uma capa preta e com um capuz ocultando seu rosto. MacGil piscou várias vezes, perguntando se ele não estaria vendo coisas. No início, ele tinha certeza de que eram apenas sombras, que era a luz bruxuleante das tochas pregando uma peça em seus olhos.

Mas um momento depois a figura estava vários passos mais perto e aproximava-se rapidamente de sua cama. MacGil tentou focalizar a vista na penumbra para poder ver quem era; instintivamente, ele começou a sentar-se e como velho guerreiro que era, ele levou a mão à cintura em busca de sua espada, ou pelo menos de seu punhal. Mas ele tinha se despido e não portava armas. Ele sentou-se em sua cama, completamente desarmado.

A figura avançava mais rapidamente agora, como uma cobra no meio da noite, aproximando-se cada vez mais e quando MacGil se sentou, ele pôde olhar para o rosto dela. O quarto ainda girava e sua bebedeira o impedia de compreender claramente, porém por um momento ele podia ter jurado que era a face de seu filho.

Gareth?

O Coração de MacGil foi inundado pelo pânico repentino enquanto ele se perguntava o que Gareth poderia estar fazendo ali, sem ser anunciado, a altas horas da noite.

“Meu filho?” Ele exclamou.

MacGil viu a intenção mortal em seus olhos e era tudo o que ele precisava ver – ele tentou dar um salto para fora da cama.

Mas a figura moveu-se muito rapidamente. Ela entrou em ação e antes que MacGil pudesse levantar a mão para  defender-se  viu o brilho reluzente do metal iluminado pelas tochas e rápido, muito rápido a lâmina de um punhal atravessou o ar penetrando em seu coração.

MacGil deu um grito, um grito estridente, cheio de angГєstia; ele surpreendeu-se com o som de seu prГіprio grito. Era um grito de batalha, um que ele havia ouvido demasiadas vezes. Era o grito de um guerreiro mortalmente ferido.

MacGil sentiu o metal frio, rompendo as costelas, forçando o caminho através de seus músculos, misturando-se com o seu sangue e em seguida, penetrando fundo, cada vez mais fundo; a dor era muito mais intensa do que ele jamais havia podido imaginar. Parecia que nunca pararia de penetrar. Com um grande suspiro, ele sentiu o sangue quente e salgado inundar a sua boca, sentiu sua respiração sufocar. Ele forçou-se a olhar para cima, para o rosto por trás da capa. Ele ficou surpreso: ele havia se enganado. Não era o rosto de seu filho. Era o de outra pessoa. Era alguém que ele reconhecia. Ele não conseguia se lembrar de quem era, Mas era alguém próximo a ele. Alguém parecido com seu filho.

Seu cГ©rebro encheu-se de confusГЈo quando ele tentou associar um nome ao rosto.

Quando a figura ficou sobre ele, segurando a adaga, MacGil de alguma forma conseguiu levantar a mão e empurrou o ombro do homem, tentando detê-lo. Ele sentiu uma onda de forças própria de um velho guerreiro aumentando dentro dele, sentiu a força de seus antepassados, sentiu que uma parte profunda dele, aquela que havia feito dele um rei, não se renderia. Com um empurrão gigante, ele conseguiu empurrar o assassino para trás, com toda sua força.

O homem era mais magro, mais frágil do que MacGil pensava e cambaleou para trás com um grito, tropeçando pelo quarto. MacGil, com um esforço supremo, conseguiu levantar-se, curvou-se e puxou o punhal do peito. Ele atirou-o pela sala e ele golpeou o chão de pedra com um ruído metálico, deslizou-se pela sala e chocou contra uma parede no fundo do quarto.

O homem, cuja capa tinha caído por trás de seus ombros, ergueu-se e olhou para ele com os olhos arregalados de terror quando MacGil começou a investir contra ele. Ele virou-se e atravessou o quarto, parando apenas o tempo suficiente para recuperar o punhal antes de fugir.

MacGil tentou ir atrás dele, porém o homem era muito mais rápido e repentinamente a dor aumentou, perfurando seu peito. Ele começou a sentir que perdia suas forças.

MacGil ficou ali, sozinho no quarto olhando para o sangue que jorrava do seu peito sobre as palmas de suas mГЈos. EntГЈo ele caiu de joelhos.

Ele sentiu seu corpo esfriar, inclinou-se para trГЎs e tentou gritar.

“Guardas!” Ouviu-se o seu grito fraco.

Ele tomou fГґlego e com uma agonia suprema, conseguiu elevar sua voz. A voz que outrora havia sido de um rei.

“GUARDAS!” Ele gritou com uma voz aguda.

Ele ouviu os passos que vinham de um corredor distante, aproximando-se lentamente. Ouviu uma porta abrir Г  distГўncia e sentiu que alguГ©m se aproximava dele. PorГ©m a sala girou novamente e dessa vez nГЈo foi devido Г  bebida.

A Гєltima coisa que ele viu foi o frio chГЈo de pedra, aproximando-se para encontrar o seu rosto.




CAPГЌTULO DOIS


Thor agarrou a aldrava de ferro da imensa porta de madeira que estava diante dele e puxou-a com toda sua força. A porta abriu lentamente com um rangido e revelou os aposentos do rei. Thor deu um passo para dentro, sentindo os pêlos dos braços dele arrepiar ao cruzar o limiar. Havia uma grande escuridão ali, persistindo no ar como um nevoeiro.

Thor deu vários passos na câmara, ouvia o crepitar das tochas nas paredes enquanto ele caminhava em direção ao corpo que jazia em um amontoado no chão. Ele já tinha podido sentir que era o rei, que o rei havia sido assassinado – que ele, Thor, tinha chegado tarde demais. Thor não podia deixar de pensar onde estavam todos os guardas, por que não havia ninguém ali para resgatá-lo?

Os joelhos de Thor enfraqueceram quando ele deu os Гєltimos passos atГ© o corpo; ele se ajoelhou no chГЈo de pedra, agarrou o ombro jГЎ frio e virou o corpo do rei.

Ali estava MacGil, seu antigo rei, deitado, com os olhos esbugalhados, morto…

Thor olhou para cima e de repente viu o servo do rei, de pé, ao lado dele. Ele segurava uma taça grande, adornada com pedras preciosas, era a mesma que Thor tinha reconhecido na festa, feita de ouro maciço e coberta de linhas de rubis e safiras. Enquanto olhava para Thor, o servo despejou o conteúdo dela lentamente sobre o peito do rei. O vinho salpicava todo o rosto de Thor.

Thor ouviu um barulho e virou-se para ver seu falcГЈo, Estopheles, empoleirado no ombro do rei; ele lambia o vinho da sua face.

Thor ouviu um barulho e se virou para ver Argon, de pГ©, olhando-o severamente. Em uma mГЈo ele segurava a coroa brilhante, na outra, seu cajado.

Argon aproximou-se e colocou firmemente a coroa na cabeça de Thor. Thor podia senti-la, seu peso afundando, encaixando confortavelmente, seu metal abraçando suas têmporas. Ele olhou para Argon com espanto.

“Agora você é o rei.” Argon pronunciou.

Thor piscou e quando abriu os olhos, diante dele estavam todos os membros da LegiГЈo, do ExГ©rcito Prata, centenas de homens e rapazes juntos lotavam a sala, todos a sua frente. Todos eles se ajoelharam sincronizados e em seguida, curvaram-se diante ele, seus rostos fitando o chГЈo.

“Nosso rei.” Pronunciou um coro de vozes.

Thor acordou com um sobressalto. Ele sentou-se ereto, respirando com dificuldade, olhando ao seu redor. Estava escuro e úmido ali e ele percebeu que ele estava sentado num chão de pedra, suas costas contra a parede. Ele piscou na escuridão, viu barras de ferro à distância e mais além delas, uma tocha flamejante. Então ele se lembrou: o calabouço. Ele tinha sido arrastado até ali, depois da festa.

Lembrou-se daquele guarda dando-lhe um soco na cara e percebeu que devia ter estado inconsciente, mas ele não sabia por quanto tempo. Thor sentou-se, respirando ofegante, tentando borrar de sua mente o sonho horrível. Tinha parecido tão real. Ele rezava para que não fosse verdade, para que o rei não estivesse morto. A imagem do rei morto estava alojada em sua mente. Thor realmente tinha visto alguma coisa? Ou era só sua imaginação?

Thor sentiu alguГ©m chutar a sola do seu pГ© e olhou para cima para ver uma figura de pГ© sobre ele.

“Está na hora de acordar.” Disse uma voz. “Estou esperando há horas.”

Na penumbra, Thor distinguiu o rosto de um adolescente que tinha mais ou menos a sua idade. Ele era magro e baixo, com bochechas fundas e pele esburacadaВ  e ainda assim, parecia haver algo gentil e inteligente por trГЎs de seus olhos verdes.

“Eu sou Merek.” Ele disse. “Seu companheiro de cela. Por que você está aqui?”

Thor sentou ereto, tentando fazer funcionar seu raciocínio. Inclinou-se contra a parede, passou as mãos pelo cabelo e tentou lembrar-se, tentou juntar todas as peças do quebra-cabeça em sua mente.

“Disseram que você tentou matar o rei.” Merek continuou.

“Ele tentou matar o rei e nós vamos picá-lo em pedacinhos se ele alguma vez sair de detrás dessas grades”. Grunhiu uma voz.

Um coro de ruídos metálicos entrou em erupção, canecas eram golpeadas contra as barras das grades e Thor olhou para ver o corredor inteiro cheio de celas. Os prisioneiros de aparência grotesca esticavam o seu pescoço através das grades e sob a luz bruxuleante das tochas olhavam para ele com desprezo. A maioria deles com a barba por fazer e com escassos dentes na boca, alguns pareciam estar ali há séculos. Era uma visão horrível e Thor obrigou-se a desviar o olhar. Ele realmente estava ali embaixo? Estaria mesmo preso ali, com aquelas pessoas, para sempre?

“Não se preocupe com eles.” Merek disse. “Somos apenas você e eu nesta cela. Eles não conseguirão entrar. E eu não poderia me importar menos se você tivesse envenenado o rei. Se eu pudesse, eu mesmo o envenenaria.”

“Eu não envenenei o rei.” Thor disse indignado. “Eu não envenenei ninguém. Estava tentando salvá-lo. Tudo que fiz foi derrubar sua taça.”

“E como você sabia que o cálice tinha sido envenenado?” Gritou uma voz bisbilhoteira vindo do corredor. “Foi mágica, eu suponho?”

Ouviu-se então um coro de risadas ecoando com cinismo por todos os corredores das celas. “Ele é vidente!”Um deles gritou, zombando.

Os outros riram.

“Não, foi só um palpite de sorte!” Outro rugiu, para o deleite dos demais.

Thor olhou furiosamente, ressentido com as acusações, desejando dar a cada um, o que eles mereciam. Mas ele sabia que seria uma perda de tempo. Além disso, ele não tinha necessidade de defender-se diante desses criminosos.

Merek o estudava com um olhar que nГЈo era tГЈo cГ©tico quanto o dos outros. Ele olhava como seВ  estivesse questionando Thor.

“Eu acredito em você.” Ele disse, calmamente.

“Você acredita?” Thor perguntou.

Merek deu de ombros.

“Afinal, se você fosse envenenar o rei, você seria tão estúpido como para avisá-lo sobre isso?”

Merek se virou e afastou-se dando alguns passos ao longo de seu lado da cela e sentou-se apoiado contra a parede, de frente para Thor.

Agora Thor estava curioso.

“E você, por que está aqui?” Ele perguntou.

“Eu sou um ladrão.” Merek respondeu um tanto orgulhoso.

Thor estava surpreso; ele nunca tinha estado na presença de um ladrão antes, um ladrão de verdade. Ele próprio nunca tinha pensado em roubar e sempre se admirava ao perceber que algumas pessoas o faziam.

“Por que você faz isso?” Thor perguntou.

Merek deu de ombros.

“Minha família não tem o que comer. Ela precisa comer. Não tenho qualquer escolaridade, ou alguma habilidade de qualquer tipo. Roubar é tudo o que eu sei fazer. Não roubo nada de importante. Na maioria das vezes só comida, ou tudo o que puder para obter comida. Eu me dei bem por anos. Então eu fui pego. Pra dizer a verdade, esta é a terceira vez que sou pego. A terceira vez é a pior de todas.”

“Por quê?” Thor perguntou.

Merek ficou calado, então balançou lentamente sua cabeça. Thor pôde ver seus olhos se encherem de lágrimas. “A lei do rei é estrita. Sem exceções. Eles castigam o terceiro delito decepando sua mão.

Thor estava horrorizado. Ele olhava para as mГЈos de Merek; ele ainda tinha as duas.

“Eles não vieram por mim ainda.” Merek disse. “Mas eles vão vir.”

Thor se sentia pГ©ssimo. Merek olhou para outro lado, como se estivesse envergonhado e Thor fez o mesmo, ele nГЈo desejava pensar nesse assunto.

Thor apoiou a cabeça em suas mãos, sua cabeça estava matando-o ao tentar conciliar seus pensamentos. Durante os últimos dias, ele se sentia como se estivesse em um redemoinho; tanta coisa tinha acontecido e tudo tão rapidamente. Por um lado, ele sentia uma sensação de sucesso, de vindicação: ele tinha visto o futuro, tinha previsto o envenenamento de MacGil e o tinha salvado disso. Talvez o destino, afinal de contas, podia ser mudado – talvez o destino pudesse ser alterado. Thor sentiu uma sensação de orgulho: ele tinha salvado seu rei.

Por outro lado, ali estava ele, no calabouço, incapaz de limpar o seu nome. Todas suas esperanças e sonhos foram despedaçados, qualquer chance de entrar para a Legião havia acabado. Agora ele seria sortudo se não tivesse de passar o resto de seus dias ali embaixo. Thor se afligia ao pensar que MacGil, quem o havia acolhido como um pai, o único pai verdadeiro que ele tinha tido, pensasse que Thor realmente tinha tentado matá-lo. Também lhe doía pensar que Reece, seu melhor amigo, pudesse acreditar que ele tinha tentado matar o seu pai. Ou ainda pior, Gwendolyn; ele pensou em seu último encontro – em como ela pensava que ele frequentava bordéis – e sentia como se tudo de bom na sua vida tivesse sido tirado dele. Ele se perguntava por que isso tudo estava acontecendo com ele. Depois de tudo, ele só tinha desejado fazer o bem.

Thor nГЈo sabia o que viria a ser dele; ele jГЎ nГЈo se importava. Tudo o que ele queria agora era limpar seu nome, para que as pessoas soubessem que ele nГЈo tinha tentado machucar o rei; que ele tinha poderes genuГ­nos; que ele realmente previa o futuro. Ele nГЈo sabia o que seria de sua vida, porГ©m ele sabia de uma coisa: de um jeito ou de outro, ele tinha de sair dali.

Antes que Thor pudesse terminar o pensamento, ele ouviu passos, botas pesadas pisando firme o seu caminho pelos corredores de pedra, entГЈo ele ouviu um barulho de chaves e momentos depois apareceu um carcereiro corpulento, era o homem que o havia arrastado atГ© ali e dado um soco em seu rosto. Ao vГЄ-lo, Thor sentiu uma oleada de dor em sua bochecha, pela primeira vez tomou consciГЄncia da dor e foi invadido por um intenso sentimento de repugnГўncia.

“Vejam só se não é o pestinha que quis matar o Rei.” O carcereiro zombou, enquanto virava a chave de ferro na fechadura. Após soarem vários cliques, ele estendeu a mão e deslizou a porta da cela. Ele carregava algemas em uma mão e levava um pequeno machado pendurado em sua cintura.

“Você logo terá seu castigo.” Ele disse para Thor com desprezo, logo se virou para Merek e disse com um sorriso malicioso: “mas agora é sua vez seu ladrãozinho. Esta é a terceira vez. Sem exceções.”

Ele partiu para cima de Merek, agarrou-o com brutalidade, dobrou um dos braços dele atrás das costas, prendeu-o com uma das algemas e enganchou o outro par em um gancho na parede. Merek gritava, puxava o grilhão descontroladamente, tentando se libertar, mas era inútil. O guarda se pôs atrás dele e o sujeitou agarrando-o forte como o abraço de um urso, tomou sua mão livre e colocou-a sobre uma pequena plataforma de pedra.

“Isto vai te ensinar a não roubar.” Ele grunhiu.

Ele retirou o machado do seu cinto e levantou-o bem acima de sua cabeça, sua boca estava escancarada exibindo seus dentes horríveis enquanto ele grasnava.

“NÃO!” Merek gritou.

Thor ficou sentado ali, horrorizado, estava petrificado quando o guarda começou a baixar o machado apontando para o pulso de Merek. Thor percebeu que em poucos segundos, esse pobre garoto teria sua mão decepada para sempre, simplesmente por praticar pequenos furtos para ajudar a alimentar sua família. A injustiça de toda a situação o queimava por dentro e ele sabia que não poderia permiti-la. Simplesmente não era justo.

Thor sentiu um calor repentino percorrer seu corpo, então sentiu dentro de si um forte ardor que provinha de seus pés e que prosseguia até as palmas de suas mãos. Ele sentiu o tempo ficar mais devagar, encontrou a si mesmo movendo-se mais rápido do que o homem, ele sentiu cada instante de cada segundo, quando o machado do guarda permaneceu ali pendurado no ar. Thor sentiu uma bola de energia ardente provir da palma de sua mão e a lançou contra o guarda.

Ele observou espantado, como a esfera amarela saiu voando da palma de sua mão, atravessou o ar, iluminando a cela escura deixando um rastro e foi direto para o rosto do guarda. A bola de fogo o atingiu na cabeça e quando ela fez isso, ele deixou cair seu machado, saiu correndo em disparada pela cela, chocou contra uma parede e desabou no chão. Thor salvou Merek uma fração de segundos antes que a lâmina atingisse seu pulso.

Merek olhava para Thor com os olhos arregalados.

O guarda balançou a cabeça e começou a levantar-se para agarrar Thor. Porém Thor sentiu de volta o poder queimando através de seu corpo e quando o guarda pôs-se de pé e dirigiu-se a ele, Thor correu para a frente, saltou no ar e chutou o homem no peito. Thor sentia um poder que nunca tinha experimentado brotar por todo o seu corpo e ouviu o barulho de algo que se rompia quando o seu chute mandou o brutamontes pelos ares, fazendo-o ir contra a parede e dessa vez cair como uma trouxa no chão, verdadeiramente inconsciente.

Merek ficou ali chocado. Thor por sua vez, sabia exatamente o que devia fazer. Ele pegou o machado e rapidamente sujeitou a algema que mantinha preso a Merek contra a pedra e, com um golpe do machado a partiu. Uma grande faísca cortou o ar quando o elo da corrente foi partido. Merek encolheu-se, logo levantou sua cabeça e olhou para a corrente que pendia sobre seus pés e percebeu que estava livre.

Ele olhava para Thor boquiaberto.

“Eu não sei como agradecer a você.” Merek disse. “Não sei como você fez isso – seja como for, seja quem você for, ou seja o que você for – você salvou minha vida. Eu lhe devo uma. E isso é algo que eu levo muito a sério.”

“Você não me deve nada.” Thor disse.

“Errado.” Merek disse estendendo a mão e apertando o antebraço do Thor. “Agora você é meu irmão. Eu vou recompensá-lo. De alguma forma. Um dia.”

Com isso, Merek se virou, apressou-se em direção à porta aberta da cela e correu pelo corredor enquanto ouvia os gritos dos outros prisioneiros.

Thor olhou para os lados, viu o carcereiro inconsciente, a porta da cela aberta e soube que ele tinha de atuar rГЎpido tambГ©m. Os gritos dos prisioneiros estavam ficando mais fortes.

Thor saiu, olhou para ambos os lados e decidiu correr em direção contrária a Merek. Depois de tudo, os dois não poderiam ser agarrados ao mesmo tempo.




CAPГЌTULO TRГЉS


Thor correu toda a noite pelas ruas caóticas da corte do Rei, ele estava espantado com a comoção em torno dele. As ruas estavam lotadas, multidões de pessoas correndo no meio da agitação. Muitas portavam tochas, iluminando a noite, projetando sombras nos rostos, enquanto os sinos do castelo soavam incessantemente. Era um tom baixo que soava uma vez a cada minuto e Thor sabia o que isso significava: morte. Os sinos da morte. E havia apenas uma pessoa no Reino por quem os sinos dobrariam nessa noite: o rei.

O coração de Thor batia descompassado enquanto ele imaginava. O punhal de seu sonho passou diante de seus olhos. E se fosse verdade?

Ele necessitava ter certeza. Ele estendeu a mão e agarrou um transeunte, um menino que ia correndo na direção oposta.

“Aonde você vai?” Thor perguntou com insistência. “Por que toda essa comoção?”

“Você não ouviu?” O garoto retrucou agitado. “Nosso rei está morrendo! Apunhalado! Multidões estão se formando ao lado do portão do rei, tentando obter notícias. Se for verdade, será terrível para todos nós. Você consegue imaginar? Uma terra sem um rei?”

Com isso, o rapaz empurrou a mГЈo de Thor, virou-se e correu de volta para a noite.

Thor ficou ali, seu coração batia agitado, desejando ignorar a realidade que o rodeava. Seus sonhos, suas premonições – eles eram mais que fantasias. Ele tinha visto o futuro. Duas vezes. E isso o assustava. Seus poderes eram mais profundos do que ele tinha consciência e parecia que ficavam mais fortes a cada dia que passava. Até onde tudo isso conduziria todos?

Thor permaneceu ali, tentando descobrir para onde ir depois. Ele tinha escapado, mas agora ele não sabia bem para onde ir. Certamente, dentro de momentos, os guardas reais – e possivelmente toda a Corte do Rei – estariam em seu encalço. O fato de que Thor tinha escapado, apenas o fazia parecer ainda mais culpado. Porém, mais uma vez, o fato de que MacGil foi apunhalado enquanto Thor estava na prisão – não o vindicaria? Ou faria parecer que ele era parte de uma conspiração?

Thor não podia arriscar-se. Claramente, ninguém no reino estava com vontade de ouvir a lógica – parecia que todos ao redor dele estavam clamando por sangue e ele provavelmente, seria o bode expiatório. Ele precisava encontrar abrigo, algum lugar para ir, no qual ele pudesse refugiar-se da tempestade e limpar seu nome. O lugar mais seguro para ir seria muito longe dali. Ele devia fugir refugiar-se em sua aldeia – ou ainda mais longe, tão longe quanto fosse possível.

Thor, porém, não desejava tomar o caminho mais seguro; essa não era sua maneira de ser. Ele queria ficar ali, limpar o seu nome e manter sua posição na Legião. Ele não era um covarde e não fugiria. Acima de tudo, ele queria ver MacGil antes que ele morresse – supondo que ele ainda estivesse vivo. Ele precisava vê-lo. Sentia-se oprimido pela culpa, por não ter sido capaz de impedir o assassinato. Por que ele tinha sido condenado a prever a morte do rei se não havia nada que ele pudesse fazer a respeito? E por que ele tinha visualizado o rei sendo envenenado quando ele foi de fato apunhalado?

Enquanto Thor estava ali, debatendo, uma ideia veio Г  sua mente: Reece. Reece era a Гєnica pessoa que certamente nГЈo o entregaria Г s autoridades e talvez atГ© mesmo lhe desse um lugar seguro onde abrigar-se. Thor sentia que Reece acreditaria nele. Ele sabia que o amor de Thor por seu pai era genuГ­no. Se alguГ©m tinha uma oportunidade de limpar o nome de Thor, esse seria Reece. Thor tinha de encontrГЎ-lo.

Thor começou a correr através dos becos, dando voltas e se esgueirando no meio da multidão, enquanto ele se afastava do portão do rei, em direção ao castelo. Ele sabia onde estavam os aposentos de Reece – na ala leste, perto da parede exterior da cidade – e ele só esperava que Reece estivesse lá dentro. Se ele estivesse, talvez Thor pudesse captar sua atenção, para que Reece o ajudasse a encontrar uma entrada para o castelo. Thor tinha a triste sensação de que se ele demorasse um pouco mais ali nas ruas, logo ele seria reconhecido. E quando essa turba o reconhecesse, ela certamente iria fazer picadinho dele.

Enquanto Thor virava rua após rua, seus pés escorregavam na lama da noite de verão até ele finalmente alcançou a parede de pedra das muralhas exteriores. Ele corria colado às paredes, ao longo delas, justo abaixo dos olhos observadores dos soldados que se encontravam a poucos passos de distância.

Quando ele se aproximou da janela de Reece, se agachou e recolheu uma pequena pedra. Afortunadamente, a Гєnica arma que nГЈo tinha sido tirada dele era a sua velha e querida funda. Ele a retirou de sua cintura, colocou a pedra nela e atirou.

Com sua pontaria certeira, Thor atirou a pedra que voou sobre as muralhas do castelo e entrou perfeitamente pela janela aberta dos aposentos de Reece. Thor ouviu o som da pedra ao bater contra a parede interna, entГЈo esperou agachado contra a muralha, para evitar ser detectado pelos guardas do rei, os quais haviam recuado com o barulho.

Nada aconteceu por vários momentos e o coração de Thor encolheu no peito quando ele se perguntou se Reece não estaria no quarto dele depois de tudo. Se não estivesse, Thor deveria fugir daquele lugar; não havia outra maneira de conseguir um lugar seguro. Ele conteve sua respiração, seu coração batia acelerado enquanto ele esperava, observando a janela aberta do quarto de Reece.

Depois do que pareceu ser uma eternidade, Thor já estava a ponto de ir embora quando ele viu uma figura se inclinar colocar a cabeça para fora da janela, apoiar as palmas das mãos no peitoril da janela e olhar ao redor com uma expressão confusa. Thor ficou de pé, deu vários para trás  tomando distância da parede e acenou com o braço levantado. Reece olhou para baixo e o viu, seu rosto se iluminou ao reconhecer Thor. Mesmo à distância, Reece estava visível sob a luz das tochas e Thor estava aliviado ao ver a alegria em sua face. Isso lhe disse tudo o que ele precisava saber: Reece não o denunciaria.

Reece lhe fez um sinal para esperar e Thor apressou-se para voltar para o lado da muralha, agachando-se justo quando o guarda se virou em sua direção.

Thor esperou ali por um bom tempo, pronto para fugir dos guardas em qualquer momento, atГ© que finalmente Reece apareceu, ele saiu ofegante por uma porta da muralha exterior, olhou para ambos os lados e viu Thor.

Reece correu até ele e o abraçou. Thor estava exultante. Ele ouviu um chiado e olhou para baixo para ver com prazer, Krohn enrolado na camisa de Reece. Krohn quase pulou da camisa quando Reece abaixou-se e entregou-o para Thor. Krohn – o filhote de leopardo branco que Thor havia resgatado antes – saltou nos braços dele rosnando, choramingando e lambendo a cara de Thor enquanto era abraçado por ele.

Reece sorria.

“Quando você foi levado embora, ele tentou segui-lo e eu o recolhi para assegurar-me de que ele estivesse a salvo.”

Thor apertou o antebraço de Reece em apreço. Então ele riu, enquanto Krohn continuava a lambê-lo.

“Eu senti sua falta, pequenino.” Thor riu, beijando-o de volta. “Silêncio agora, ou os guardas vão nos ouvir.”

Krohn ficou quieto, como se tivesse entendido.

“Como você escapou?” Reece perguntou surpreso.

Thor deu de ombros. Ele nГЈo sabia bem o que dizer. Ele se sentia incГґmodo falando sobre os seus poderes, os quais ele nГЈo entendia. Ele nГЈo queria que os demais pensassem que ele era um anormal.

“Eu creio que tive sorte.” Ele respondeu. “Eu tive uma oportunidade e a aproveitei.”

“Estou espantado de ver que a multidão não fez picadinho de você.” Reece disse.

“Está escuro.” Thor disse. “Não creio que alguém tenha me reconhecido… Até agora não.”

“Você sabia que cada soldado do Reino está à sua procura? Você sabia que meu pai foi apunhalado?”

Thor assentiu com a cabeça, sério. “Ele está bem?”

O rosto de Reece ficou severo.

“Não.” Ele respondeu sombrio. “Ele está morrendo.”

Thor se sentiu devastado, como se estivesse falando de seu prГіprio pai.

“Sabe que eu não tive nada a ver com isso, não é?” Thor perguntou esperançoso. Ele não se importava com o que os demais pensavam, mas para ele era importante que seu melhor amigo, o caçula dos MacGil, soubesse que ele era inocente.

“Claro!” Reece disse. “Do contrário eu não estaria aqui agora com você.”

Thor sentiu uma onda de alГ­vio e apertou ombro de Reece com gratidГЈo.

“Mas o resto do Reino não será tão confiável como eu.” Reece acrescentou. “O lugar mais seguro para você é bem longe daqui. Eu lhe darei meu cavalo mais veloz, um pacote de suprimentos e enviarei você para longe. Você deve se esconder até que todo este assunto se acalme, até que eles encontrem o verdadeiro assassino. Ninguém é capaz de pensar com claridade neste momento.”

Thor sacudiu sua cabeça.

“Eu não posso ir embora.” Ele disse. “Isso faria com que eu parecesse culpado. É importante para mim que os demais saibam que eu não fiz isso. Não posso fugir de meus problemas. Eu devo limpar o meu nome.”

Reece sacudiu sua cabeça.

“Se você ficar aqui, eles o encontrarão. Você vai ser preso novamente – e depois executado – se não for linchado por uma turba primeiro.”

“Esse é um risco que eu devo correr.” Disse Thor.

Reece olhou firmemente para ele por um bom tempo, seu olhar mudou passando de demonstrar preocupação para expressar admiração. Finalmente, ele assentiu movendo a cabeça devagar.

“Você é orgulhoso e estúpido. Muito estúpido. É por isso que eu gosto de você.”

Reece sorriu. Thor sorriu-lhe de volta.

“Eu preciso ver vosso pai.” Thor disse. “Eu preciso ter uma chance para explicar-lhe, face a face, que não fui eu, que não tenho nada a ver com isso. Se ele decidir condenar-me, que assim seja. Mas preciso de uma chance. Eu quero que ele saiba. Isso é tudo o que eu lhe peço.”

Reece olhou para Thor firmemente, examinando seu amigo. Finalmente, após o que pareceu ser uma eternidade, ele acenou com a cabeça.

“Eu posso levá-lo até ele. Eu conheço um caminho retirado. Ele conduz aos aposentos. É arriscado – e uma vez lá dentro, você estará por sua própria conta. Não há nenhuma saída. Não haverá nada que eu possa fazer por você a partir daí. Poderá significar até mesmo a sua morte. Tem certeza de que quer se arriscar?”

Thor assentiu com seriedade mortal.

“Muito bem, então.” Reece disse, e, de repente, abaixou-se e jogou um manto sobre Thor.

Thor o pegou e olhou para ele com surpresa; Ele percebeu que Reece devia ter planejado isso todo o tempo. Reece sorriu quando Thor olhou para ele.

“Eu sabia que você seria idiota o suficiente para querer ficar. Eu não esperava menos do meu melhor amigo.”




CAPГЌTULO QUATRO


Gareth passeava por seus aposentos, revivendo os acontecimentos da noite, cheio de ansiedade. Ele não podia acreditar no que tinha acontecido na festa, como tudo tinha saído tão errado. Ele mal podia compreender que aquele garoto estúpido, aquele forasteiro Thor, tinha de alguma forma descoberto sua trama venenosa – e ainda tinha de fato, conseguido interceptar o cálice. Gareth pensou novamente no momento em que viu Thor pular e derrubar o cálice, quando ele ouviu o cálice bater sobre a pedra, observou como o vinho se derramava sobre o chão e com ele derramavam-se também todos os seus sonhos e aspirações.

Naquele momento, Gareth tinha sido arruinado. Tudo pelo qual ele tinha vivido tinha sido esmagado. E quando o cão lambeu o vinho e caiu morto – ele sabia que estava acabado. Ele viu toda a sua vida passar diante dele, viu-se descoberto, sentenciado a prisão perpétua no calabouço por tentar assassinar seu pai. Ou pior ainda, executado. Era uma estupidez. Ele jamais deveria ter seguido adiante com o plano, jamais deveria ter visitado aquela bruxa.

Gareth tinha, pelo menos, atuado rapidamente, aproveitando a oportunidade, saltando rápido para ser o primeiro a colocar a culpa em Thor. Olhando em retrospectiva, ele estava orgulhoso de si mesmo, de como ele havia reagido com rapidez. Tinha sido um momento de inspiração e para sua surpresa, parecia ter funcionado muito bem. Eles tinham arrastado Thor para fora e depois disso, a festa tinha quase voltado à normalidade novamente. Claro, nada seria igual novamente depois de tudo, mas pelo menos, a suspeita parecia cair diretamente sobre o rapaz.

Gareth simplesmente rezava para que as coisas permanecessem assim. Fazia dГ©cadas que tinha havido um atentado contra um MacGil e Gareth temia que houvesse um inquГ©rito, que eles acabassem investigando mais profundamente o assunto. Reconsiderando tudo, tinha sido tolo tentar envenenГЎ-lo. Seu pai era invencГ­vel. Gareth deveria saber disso. Ele havia se excedido e agora nГЈo podia evitar pensar que era apenas questГЈo de tempo para que as suspeitas recaГ­ssem sobre ele. Ele deveria fazer o que fosse preciso, para provar que Thor era culpado e fazer com que ele fosse executado, antes que fosse tarde demais.

Pelo menos Gareth tinha de algum modo, se redimido: depois da tentativa fracassada, ele tinha cancelado o assassinato. Agora, Gareth se sentia aliviado. Depois de assistir a trama falhar, ele tinha percebido que havia uma parte dele, bem no fundo, que nГЈo desejava matar seu pai, depois de tudo, ele nГЈo queria sujar suas mГЈos com sangue. Ele nГЈo seria o rei. Ele poderia nunca chegar a ser rei. PorГ©m, depois dos eventos dessa noite ele colocou as coisas em perspectiva. Pelo menos ele estaria livre. Ele nunca poderia lidar com o estresse de passar por tudo isso novamente: os segredos, o encobrimento, a ansiedade constante de ser descoberto. Tudo isso era demais para ele.

Enquanto ele caminhava, a noite ia avançando, finalmente, lentamente, ele começou a acalmar-se. Justo quando ele estava começando a sentir-se normal outra vez, preparando-se para passar a noite, ouviu um golpe súbito e virou-se para ver sua porta se abrir de par em par. Firth entrou por ela em uma estampida, os olhos arregalados, irrompendo pela sala como se estivesse sendo perseguido.

“Ele está morto!” Firth exclamou. “Ele está morto! Eu o matei. Ele está morto!”

Firth estava berrando histГ©rico. Gareth nГЈo tinha a menor ideia do que ele estava dizendo. SerГЎ que ele estava bГЄbado?

Firth correu pela sala, gritando, chorando, levantando suas mãos – e foi então quando Gareth notou as palmas das mãos dele, cobertas de sangue, sua túnica amarela, manchada de vermelho.

O coração de Gareth disparou. Firth tinha acabado de matar alguém. Mas quem?

“Quem está morto?” Gareth insistiu. “De quem você está falando?”

No entanto, Firth estava histГ©rico e nГЈo podia concentrar-se. Gareth correu atГ© ele, agarrou-o pelos ombros com firmeza e o sacudiu.

“Responda!”

Firth abriu seus olhos e o fitou, seu olhar era o de um cavalo selvagem.

“Vosso pai! O Rei! Ele foi morto! Por minhas próprias mãos!”

Ao ouvir essas palavras, Gareth sentiu como se uma faca tivesse sido enfiada em seu próprio coração.

Ele olhou para Firth com os olhos arregalados, sentindo o corpo todo dormente. Ele afrouxou a pressГЈo das suas mГЈos, deu um passo atrГЎs e tentou recuperar o fГґlego. Ele podia ver por todo aquele sangue que Firth estava dizendo a verdade. Ele nГЈo podia compreender. Firth? O garoto do estГЎbulo? O mais pusilГўnime de todos os seus amigos? Matou o seu pai?

“Mas… Como é possível?” Gareth gritou. “Quando?”

“Isso aconteceu no quarto dele.” Firth disse. “Agora mesmo. Eu o apunhalei.”

A realidade da notícia começou a assentar e Gareth recuperou seu raciocínio; ele percebeu que sua porta estava aberta, correu até ela e fechou-a rapidamente, assegurando-se antes que nenhum dos guardas tivesse visto nada. Por sorte, o corredor estava vazio. Então ele passou o ferrolho de ferro pesado através da porta.

Ele voltou rГЎpido para o interior do quarto. Firth ainda estava histГ©rico e Gareth necessitava acalmГЎ-lo. Ele precisava de respostas.

Gareth agarrou Firth pelos ombros, girou-o e o esbofeteou com força o suficiente para fazê-lo controlar-se. Finalmente, Firth se concentrou nele.

“Conte-me tudo! Gareth ordenou friamente. “Diga-me exatamente o que aconteceu. Por que você fez isso?”

“O que quer dizer com �Por que’?” Firth perguntou confuso. “Você queria matá-lo. Seu veneno não funcionou… Achei que poderia ajudá-lo. Eu pensei que isso era o que queria.”

Gareth balançou a cabeça. Ele agarrou Firth pela camisa e o sacudiu, vez após vez.

“Por que você fez isso?!” Gareth gritou.

Gareth sentiu seu mundo inteiro desmoronar-se. Ele ficou chocado ao perceber que realmente sentia pesar por seu pai. Ele não conseguia entender nada. Há apenas umas horas, ele tinha desejado mais que tudo na vida, vê-lo envenenado, morto à mesa. Agora a ideia de sua morte golpeou-o da mesma maneira que a morte do melhor amigo. Sentia-se oprimido pelo remorso. Uma parte dele não queria que o pai morresse depois de tudo – sobretudo dessa maneira. Não pelas mãos de Firth. E não com um punhal.

“Eu não entendo.” Firth choramingou. “Há apenas umas horas, você mesmo tentou matá-lo. Com o seu plano do cálice. Eu pensei que você ficaria muito agradecido!”

Para sua prГіpria surpresa, Gareth se aproximou de Firth e esbofeteou-lhe o rosto.

“Eu não mandei você fazer isso!” Gareth cuspiu as palavras. “Eu nunca lhe disse que fizesse tal coisa. Por que você o matou? Olhe como você está… todo coberto de sangue. Agora ambos estamos arruinados. É só uma questão de tempo até que os guardas nos peguem.”

“Ninguém viu.” Firth alegou. “Eu me meti durante a troca de guardas. Ninguém me notou.”

“E onde está a arma?”

“Eu não a deixei lá.” Firth disse com orgulho. “Eu não sou burro. Eu me desfiz dela.”

“E que punhal você usou?” Gareth perguntou, sua cabeça dava voltas com as implicações. Ele passou do remorso à preocupação; sua mente voava com cada detalhe do rastro que esse idiota e desastrado poderia ter deixado; cada detalhe que poderia conduzir até ele.

“Eu usei uma que não pode ser rastreada.” Firth disse orgulhoso de si. “Era um punhal comum, totalmente impossível de identificar. Eu o encontrei nos estábulos. Havia quatro idênticos a ele. Ele não poderia ser rastreado.” Ele repetiu.

Gareth sentiu seu coração na boca do estômago.

“Era um punhal pequeno, com um cabo vermelho e uma lâmina curva? Pendurado na parede ao lado do meu cavalo?”

Firth assentiu com a cabeça, agora seu olhar era duvidoso.

Gareth o olhou furiosamente.

“Seu idiota. Claro que esse punhal é rastreável!”

“Mas não havia nenhuma marca nele!” Firth protestou soando assustado com sua voz trêmula.

“Não há marcas na lâmina – mas há uma marca no cabo!” Gareth gritou. “Na parte de baixo! Você deveria ter examinado com mais cautela. Seu idiota!” Gareth deu um passo à frente, enrubescendo. “O emblema do meu cavalo está talhado na parte de baixo. Qualquer um que conhecer bem a família real poderá rastrear a lâmina e dar comigo.”

Ele fitava Firth, que parecia perplexo. Gareth queria matГЎ-lo.

“O que você fez com ele?” Gareth insistiu. “Diga-me que o punhal está com você. Diga que o trouxe de volta. Por favor!”

Firth engoliu em seco.

“Eu me desfiz dele com muito cuidado. Ninguém jamais o encontrará.”

Gareth fez uma careta.

“Onde exatamente?”

“Atirei-o na rampa de pedra que leva os dejetos do castelo até o pote sanitário. Eles esvaziam os potes no rio de hora em hora. Não se preocupe Alteza. Ele agora já está no fundo do rio.”

Os sinos do Castelo de repente soaram e Gareth se virou e correu para a janela aberta, seu foi coração invadido pelo pânico. Ele olhou pela janela e viu todo o caos e confusão lá embaixo, as multidões ao redor do castelo. Os sinos a badalar só podiam significar uma coisa: Firth não estava mentindo. Ele tinha mesmo matado o rei.

Gareth sentiu o sangue congelar em suas veias. Ele nГЈo podia conceber que tinha posto em marcha um mal tГЈo grande. E que Firth, de todas as pessoas, o havia executado.

De repente alguГ©m bateu a sua porta e ela quando ela foi aberta, vГЎrios guardas irromperam por ela. Por um momento Gareth estava seguro de que eles iriam arrestГЎ-lo.

Mas para sua surpresa, eles pararam diante dele em posição reverente.

“Vossa alteza, vosso pai foi apunhalado. O assassino pode estar à solta. Assegure-se de permanecer a salvo em seu quarto. O Rei está gravemente ferido.”

Gareth sentiu um arrepio na nuca ao ouvir essas Гєltimas palavras.

“Ferido?” Gareth repetiu; a palavra quase atragantada em sua garganta. “Então ele está vivo?”

“Sim, Alteza, e que Deus esteja com ele. Ele vai sobreviver e nos dirá quem realizou esse ato hediondo.”

Os guardas fizeram uma curta reverência e deixaram a sala rapidamente, fechando a porta com força detrás de si.

A raiva se apoderou de Gareth, ele agarrou Firth pelos ombros, empurrou-o pelo quarto e o jogou contra a parede de pedra.

Firth olhava para ele, os olhos arregalados, fitando-o horrorizados, sem palavras.

“O que você fez?” Gareth gritou. “Agora, ambos estamos arruinados!”

“Mas… mas…” Firth gaguejou. “… Eu tinha certeza de que ele estava morto!”

“Você tinha certeza de muitas coisas.” Gareth disse. “E todas elas estavam erradas!”

Gareth teve uma ideia.

“Aquele punhal…” Ele disse. “Nós temos de recuperá-lo, antes que seja tarde demais.”

“Mas eu o joguei fora, Alteza!” Firth disse. “Ele foi levado pela correnteza do rio!”

“Você o jogou na fossa. Isso não significa que ele já esteja no rio.”

“Mas é onde é mais provável que ele esteja!” Firth disse.

Gareth nГЈo podia mais suportar esse idiota, esse desastrado. Ele passou rГЎpido por ele, saindo pela porta, Firth em seus calcanhares.

“Eu vou com você. Eu vou mostrar-lhe exatamente onde eu o joguei.” Firth disse.

Gareth parou no corredor, virou-se e olhou para Firth. Ele estava coberto de sangue e Gareth estava surpreso por ver que os guardas não haviam notado sua presença. Era pura sorte. Firth agora era mais inconveniente que nunca.

“Eu vou dizer isto apenas uma vez.” Gareth grunhiu. “Volte para meu quarto de uma vez por todas, troque essas roupas e queime-as. Elimine qualquer vestígio de sangue. Depois, desapareça do castelo. Fique longe de mim esta noite! Você me entendeu?”

Gareth o enxotou, então se virou e correu. Ele corria pelo corredor, desceu correndo a escada de pedra espiralada, andar por andar, em direção à ala dos servos.

Finalmente, ele chegou até o porão, ao vê-lo os servos voltaram suas cabeças. Eles estavam em meio à rotina de esfregar panelas enormes e ferver baldes de água. Um fogo gigantesco se elevava no forno de tijolos e os servos com seus aventais sujos estavam banhados de suor.

No fundo da sala, Gareth avistou um enorme pote no qual eram despejados os dejetos que eram conduzidos pela rampa de pedra a cada minuto.

Gareth correu para o servo mais próximo e agarrou o braço dele desesperadamente.

“Quando o último pote foi esvaziado?” Gareth perguntou.

“Ele foi levado para o rio há poucos minutos, Alteza.”

Gareth se virou e correu para fora da sala, desceu rГЎpido pelos corredores do castelo, subiu de volta a escada em espiral e precipitou-se no ar fresco da noite.

Ele corria ofegante através da relva do campo, em direção ao rio.

Quando se aproximou do rio, ele encontrou um lugar para ocultar-se detrГЎs de uma ГЎrvore enorme, perto da margem do rio. Ele viu os dois servos levantar o pote enorme de ferro inclinГЎ-lo e despejar o seu conteГєdo na correnteza do rio.

Ele observou o pote até vê-lo de cabeça para baixo e totalmente vazio, até ver os guardas regressarem com ele seguindo seu caminho de volta, em direção ao castelo.

Finalmente, Gareth estava satisfeito. NinguГ©m havia encontrado o punhal. Onde quer que ele estivesse, estava agora na correnteza do rio, sendo lavado pelo anonimato. Se o seu pai morresse naquela noite, nГЈo haveria nenhuma evidГЄncia que conduzisse ao assassino.

Ou sim?




CAPГЌTULO CINCO


Thor seguia atrás de Reece, Krohn ia atrás dele enquanto traçavam seu caminho através da passagem  para os aposentos do rei. Reece os havia conduzido por uma porta secreta, oculta em uma das paredes de pedra e agora levava uma tocha, guiando-os enquanto caminhavam em fila no espaço apertado. Tentavam achar a saída através das entranhas do palácio em uma confusa e emaranhada série de voltas. Eles subiram por uma estreita escada de pedra que levava a outra passagem. Eles deram uma volta e diante deles havia outra escadaria, Thor estava surpreso de ver o quanto a passagem era intricada.

“Essa passagem foi construída dentro do Castelo há centenas de anos.” Reece explicou sussurrando enquanto eles prosseguiam, respirando com dificuldade  à medida que subiam. “Foi construída pelo bisavô do meu pai, o terceiro Rei MacGil. Ele a construiu depois de um cerco – é uma rota de escape. Ironicamente, nós nunca fomos cercados desde então e estas passagens não têm sido usadas por séculos. Elas estavam fechadas, eu as descobri quando era criança. Eu gosto de usá-las de vez em quando para andar pelo castelo sem que ninguém saiba por onde eu ando. Quando éramos mais novos, Gwen, Godfrey e eu costumávamos brincar de esconde-esconde nelas. Kendrick era bem mais velho e Gareth não gostava de brincar conosco. Sem tochas, essa era a regra. Escuro como breu. Era assustador naquele tempo.”

Thor tentava acompanhar Reece enquanto ele percorria a passagem com uma impressionante exibição de virtuosismo, era óbvio que ele sabia cada passo de cor.

“Como é possível que se lembre de todas essas voltas?” Thor perguntou admirado.

“Você se converte em um solitário, crescendo como um garoto neste castelo.” Reece continuou. “Especialmente quando todo mundo é mais velho, você ainda é muito jovem para entrar para a Legião e não tem muito o que fazer. Eu fiz de minha missão descobrir cada canto e recanto desse lugar.”

Eles deram mais uma volta, desceram trГЄs degraus de pedra, viraram e passaram por uma abertura estreita na parede, entГЈo desceram uma longa escada. Finalmente, Reece os levou atГ© uma grossa porta de carvalho coberta de poeira. Ele inclinou-se, encostou a orelha na porta e escutou. Thor se aproximou e ficou ao lado dele.

“Que porta é essa?” Thor perguntou.

“Psiu!” Reece pediu silêncio.

Thor ficou quieto e tambГ©m encostou sua orelha na porta, escutando. Krohn ficou ali atrГЎs deles, olhando para cima.

“É a porta traseira dos aposentos de meu pai.” Reece sussurrou. “Eu quero ouvir para saber quem está com ele.”

Thor ouvia as vozes abafadas atrás da porta com o coração batendo descompassado.

“Parece que a sala está cheia.” Reece disse.

Reece virou-se e deu uma olhada significativa para Thor.

“Você estará andando direto para uma tempestade de fogo. Os generais estão aí, os conselheiros, a família real – todo o mundo está aí. Eu tenho certeza de que cada um deles estará à sua procura, você é o suposto assassino. Vai ser como entrar em uma turba de linchamento. Se meu pai ainda achar que você tentou assassiná-lo, você estará acabado. Tem certeza de que quer fazer isso?”

Thor engoliu em seco. Era agora ou nunca. Sua garganta secou quando ele percebeu que esse era um dos momentos de reviravolta em sua vida. Seria muito mais fácil voltar atrás agora, fugir. Ele poderia ter uma vida tranquila em algum lugar, longe da Corte do Rei. Ou então, ele poderia passar por aquela porta e certamente acabar passando o resto de sua vida no calabouço, junto com aqueles cretinos – ou pior ainda, ser executado.

Ele respirou fundo e decidiu-se. Ele tinha de enfrentar seus demГґnios cara a cara. Ele nГЈo podia retroceder.

Thor assentiu com a cabeça. Ele estava com medo de abrir a boca, com medo de que caso o fizesse, acabasse mudando de ideia.

Reece acenou de volta com um olhar de aprovação, em seguida, puxou o trinco de ferro e empurrou a porta com seu ombro.

Thor piscou com a luz das tochas brilhantes quando a porta foi aberta. Ele encontrava-se de pГ© no meio dos aposentos do rei, Krohn e Reece logo atrГЎs dele.

Havia pelo menos duas dúzias de pessoas apinhadas em torno do rei, quem jazia em seu leito; algumas estavam de pé ao lado dele, outras ajoelhadas. Em torno do rei estavam seus conselheiros e generais, junto com Argon, a rainha, Kendrick, Godfrey – e até mesmo Gwendolyn. Era uma vigília de morte, e Thor estava invadindo um momento privado da família.

A atmosfera na sala estava sombria, a expressão dos rostos era grave. MacGil jazia sobre uma pilha de travesseiros e para o alívio de Thor ele ainda estava vivo – pelo menos por enquanto.

Todos os rostos se voltaram, estupefatos diante da súbita entrada de Thor e Reece. Thor percebeu que sua repentina aparição no meio do quarto e sua entrada  por uma porta secreta na parede deviam ter causado um tremendo choque.

“Esse é o rapaz!” Gritou alguém na multidão, ficando de pé e apontando para Thor com ódio. “Foi ele quem quis envenenar o Rei!”

Guardas investiram contra ele de todos os cantos da sala. Thor nГЈo sabia o que fazer. Uma parte dele desejava dar volta e fugir, porГ©m ele tinha de enfrentar essa turba furiosa, tinha de fazer as pazes com o Rei. EntГЈo ele se preparou quando vГЎrios guardas correram para a frente, tentando agarrГЎ-lo. Krohn, ao seu lado, rosnava, advertindo-lhe sobre seus atacantes.

Ao permanecer ali, ele sentiu um calor sГєbito tomar seu corpo, um poder surgindo de dentro dele; ele levantou uma mГЈo involuntariamente estendeu sua palma e dirigiu sua energia diretamente a eles.

Thor ficou espantado quando todos eles pararam no meio da investida, a poucos passos de distГўncia, como se estivessem congelados. Seu poder, qualquer que fosse, brotava dele, mantendo os guardas Г  distГўncia.

“Como ousa entrar aqui e usar de feitiçaria, rapaz?!” Brom – o general mais prestigiado— do rei gritou desembainhando sua espada. “Tentar matar nosso Rei uma vez não foi o suficiente?”

Brom aproximou-se de Thor com sua espada na mГЈo; quando ele fez isso, Thor sentiu algo apoderar-se dele, um sentimento mais forte do que qualquer outro que ele jГЎ tinha tido. Ele simplesmente fechou os olhos e se concentrou. Ele sentia a energia da espada de Brom, sua forma, seu metal e de alguma maneira ele e a espada eram um sГі ser. E na sua mente ele quis detГЄ-la.

Brom ficou congelado no meio do caminho, com os olhos arregalados.

“Argon!” Brom gritou. “Detenha esse feiticeiro de uma vez! Detenha o rapaz!”

Argon deu um passo à frente da multidão e lentamente baixou o capuz de sua cabeça. Ele encarou Thor com seus olhos intensos, ardentes.

“Eu não vejo nenhuma razão para detê-lo.” Disse Argon. “Ele não veio aqui para causar nenhum dano.”

“Por acaso está louco? Ele quase matou o nosso Rei!”

“Isso é o que você supõe.” Argon respondeu. “Isso não é o que eu vejo.”

“Deixe-o ficar.” Disse uma voz grave e profunda.

Todo mundo voltou-se quando o Rei MacGil sentou na cama. Ele se via mal, muito fraco. Notava-se claramente que fazia um grande esforço para falar.

“Eu quero ver o rapaz. Não foi ele quem me apunhalou. Eu vi o rosto do homem, e não era ele. Thor é inocente.”

Lentamente, os outros baixaram a guarda e Thor relaxou sua mente, deixando-os ir. Os guardas retrocederam, olhando para Thor com cautela, como se ele fosse de outro mundo e lentamente puseram suas espadas de volta nas bainhas.

“Eu quero vê-lo.” MacGil disse. “A sós. Vocês todos. Deixem-nos a sós.”

“Meu Rei…” Brom disse. “Vossa Majestade acha mesmo que é seguro? Somente Vossa Majestade e o rapaz aqui sozinhos?”

“Thor não deve ser tocado.” MacGil disse. “Agora saiam. Todos vocês: incluindo minha família.”

Um silГЄncio espesso caiu sobre a sala quando todos se entreolharam claramente em dГєvida, sobre o que deviam fazer. Thor permaneceu ali, os pГ©s grudados no chГЈo, ele mal podia processar o que acontecia.

Um por um, os outros, incluindo a famГ­lia do rei, saГ­ram da sala em fila, Krohn ficou aos cuidados de Reece. O quarto, que momentos antes estava tГЈo cheio de pessoas, de repente estava vazio.

A porta foi fechada. Eram apenas Thor e o rei, sozinhos no silГЄncio. Thor mal podia acreditar. Ver MacGil deitado ali, tГЈo pГЎlido, sentindo tanta dor, afligia Thor muito mais do que ele poderia imaginar. Ele nГЈo sabia o porquГЄ, mas era quase como se uma parte dele estivesse morrendo tambГ©m, ali, naquela cama. Ele desejava mais que tudo no mundo que o rei estivesse bem.

“Venha aqui meu jovem.” MacGil disse debilmente, sua voz rouca, apenas mais alta do que um sussurro.

Thor baixou a cabeça e correu para o lado do rei, ajoelhando-se diante dele. O rei estendeu-lhe o pulso mole; Thor pegou sua mão e beijou-a.

Thor olhou e viu MacGil sorrindo fracamente. Thor surpreendeu-se ao sentir as lГЎgrimas quentes rolando por seu rosto.

“Meu senhor.” Thor começou, falando rapidamente. “Por favor, acredite em mim. Eu não o envenenei. Eu sabia do plano por causa do sonho que eu tive. Devido a poderes que eu desconheço. Eu só queria avisar. Por favor, acredite em mim.”

MacGil levantou a mГЈo e Thor ficou em silГЄncio.

“Eu estava errado sobre você.” MacGil disse. “Foi preciso ser apunhalado por outro homem, para que eu me desse conta de que não era você. Você estava apenas tentando me salvar. Perdoe-me. Você foi leal. Talvez haja sido o único membro leal de minha corte.”

“Como eu gostaria de estar errado.” Thor disse. “Como eu desejaria que Vossa Majestade estivesse a salvo. Que todos os meus sonhos fossem apenas ilusões; que Vossa Majestade não tivesse sido vítima de um assassinato. Talvez eu esteja errado. Talvez Vossa Majestade sobreviva.”

MacGil balançou a cabeça.

“Chegou a minha hora.” Ele disse para Thor.

Thor engoliu seco, esperando que nГЈo fosse verdade, mas sentia que era.

“Vossa Majestade sabe quem cometeu este terrível ato?” Thor fez a pergunta que o queimava por dentro e dava voltas em sua mente desde que ele tinha tido o sonho. Ele não podia imaginar quem desejaria matar o rei, ou por quê.

MacGil olhou para o teto, piscando com o esforço.

“Eu vi o rosto dele. É um rosto que eu conheço bem. Porém, por alguma razão, eu não consigo identificá-lo.”

Ele se virou e olhou para Thor.

“Isso não importa agora. Minha hora chegou. Quer tenha sido pela mão dele, quer tenha sido pela mão de outro, o final será o mesmo. O que importa agora…” Ele disse aproximando-se de Thor e tomando o seu pulso com uma força que o surpreendeu. “… É o que acontecerá quando eu morrer. O nosso, será um reino sem rei.”

MacGil olhava para Thor com uma intensidade que Thor não entendia. Thor não sabia precisamente o que ele dizia – o que, em todo caso, ele estava exigindo. Thor queria perguntar, mas ele podia ver o quão difícil era para MacGil poder respirar normalmente e ele não queria arriscar-se a interrompê-lo.

“Argon estava certo sobre você.” Ele disse afrouxando lentamente a pressão no pulso de Thor. “Seu destino é muito superior ao meu.”

Thor sentiu um choque elétrico percorrer seu corpo ao ouvir as palavras do rei. Seu destino? Superior ao do rei? A ideia de que o Rei tivesse se incomodado em discutir sobre ele com Argon estava além da compreensão de Thor. E o fato de que ele dissesse que o destino de Thor era superior ao seu próprio – o que ele realmente queria dizer com isso? Será que o Rei MacGil estava simplesmente delirando em seus últimos momentos de vida?

“Eu escolhi você… Eu acolhi você em minha família, por uma razão. Você sabe qual foi o motivo?”

Thor abanou a cabeça, querendo desesperadamente saber.

“Você não sabe por que eu o queria aqui, apenas você, em meus últimos momentos?”

“Eu sinto muito, meu senhor.” Thor disse sacudindo a cabeça. “Eu não sei.”

MacGil sorriu fracamente, seus olhos começaram a fechar-se.

“Há uma grande terra, muito longe daqui. Muito além da Selva. Além até mesmo da Terra dos Dragões. É a Terra dos Druidas. O lugar de onde sua mãe proveio. Você deve ir lá para procurar as respostas.”

Os olhos de MacGil se abriram e ele ficou olhando para Thor com uma intensidade que Thor nГЈo podia compreender.

“Nosso reino depende disso.” Ele acrescentou. “Você não é igual aos demais. Você é especial. Até que você compreenda quem realmente é, o nosso reino nunca poderá descansar em paz.”

Os olhos do MacGil se fecharam e sua respiração diminuiu o ritmo, cada vez que ele exalava se sufocava. A pressão de sua mão sobre o pulso de Thor se debilitava paulatinamente. Thor sentiu seus olhos se encherem de lágrimas. Sua mente dava voltas com tudo o que o rei tinha lhe dito, ele tentava encontrar o sentido daquelas palavras. Mal podia concentrar-se. Será que ele havia escutado bem?

MacGil começou a sussurrar algo, mas falava tão baixinho, Thor mal podia entender. Ele se inclinou aproximando seu ouvido dos lábios do rei.

O rei levantou a cabeça por última vez e com um último esforço disse:

“Vingue-me.”

Então, de repente, MacGil teve um espasmo. Permaneceu assim por alguns momentos, então sua cabeça pendeu para o lado com seus olhos abertos, fixos. Morto.

“NÃO!” Thor gritou com estridência.

Seu grito deve ter sido alto o suficiente para alertar os guardas porque um instante mais tarde, ele ouviu uma porta atrás dele se abrir com força, ouviu o barulho de dezenas de pessoas correndo para a sala. Nos recônditos de sua consciência ele entendeu que havia movimento ao seu redor. Ele ouvia, parecia que bem ao longe, as badaladas dos sinos do castelo soando uma e outra vez. Os sinos batiam sincronizando com o pulsar do sangue em suas têmporas. Tudo então ficou fora de foco e momentos depois a sala começou a girar.

Thor estava desmaiando, caindo vertiginosamente sobre o chГЈo de pedra.




CAPГЌTULO SEIS


Uma rajada de vento golpeou o rosto de Gareth e ele olhou para cima, piscando com as lágrimas na pálida luz dos primeiros raios de sol. O dia estava quase amanhecendo e já naquele lugar remoto, ali na borda dos penhascos Kolvian, estavam reunidas centenas de pessoas: membros da família do rei, amigos, súditos leias e íntimos circulando por perto, na esperança de participar do funeral. Um pouco mais além, controladas pelo exército de soldados, Gareth podia ver as massas espalhando-se, milhares de pessoas observando a cerimônia desde a distância. O pesar era genuíno. Seu pai era muito amado, isso era uma realidade.

Gareth ficou com o resto da família imediata em um semicírculo ao redor do corpo do seu pai, o qual jazia suspenso sobre prancha ao longo de uma cova aberta na terra. As cordas que sustentavam a prancha logo seriam baixadas. Argon estava diante da multidão, usava a túnica vermelho escura que reservava somente para os funerais, ele olhava para o cadáver do rei com uma expressão inescrutável, o capuz ensombrecia o seu rosto. Gareth tentava desesperadamente analisar aquela face para decifrar o que Argon poderia saber. Argon sabia que ele tinha matado seu pai? E se soubesse, ele contaria aos outros – ou deixaria tudo nas mãos do destino?

Para a desgraça de Gareth, aquele garoto impertinente, Thor, havia sido declarado inocente. Obviamente, ele não podia ter esfaqueado o rei enquanto estava no calabouço. Sem mencionar que o pai tinha dito a todos os outros que Thor era inocente, o que só piorava as coisas para Gareth. Um Conselho já havia sido formado para investigar o assunto, para examinar cada detalhe do assassinato. O coração de Gareth batia forte enquanto ele permanecia ali com os outros, vendo o corpo que logo desceria à terra. Gareth desejou descer junto com ele.

Era só uma questão de tempo até que as pistas conduzissem a Firth – e quando isso acontecesse, Gareth cairia junto com ele. Ele teria de agir rapidamente para desviar a atenção, para jogar a culpa em outro alguém. Gareth se perguntava se alguém ao seu redor suspeitaria dele. Ele estava provavelmente apenas sendo paranóico e quando ele examinou os rostos, não viu ninguém olhando para ele. Ali estavam seus irmãos todos de pé: Reece, Godfrey, e Kendrick; sua irmã Gwendolyn e sua mãe, o rosto dela estava contorcido de dor, parecia catatônica; de fato, desde a morte do pai, ela tinha sido uma pessoa diferente, mal podia emitir uma palavra. Ele tinha ouvido falar que quando ela recebeu a notícia, algo tinha acontecido dentro dela, ela tinha tido uma espécie de paralisia. Metade do seu rosto estava imóvel; quando ela abria a boca para dizer alguma coisa, as palavras saíam lentamente.

Gareth examinou os rostos dos conselheiros do rei atrás dela – seu general líder, Brom e o general da Legião, Kolk, permaneciam à frente, atrás deles estavam os intermináveis conselheiros do seu pai. Todos eles fingiam pesar, porém Gareth os conhecia muito bem. Ele conhecia bem todas aquelas pessoas, os membros do Conselho, conselheiros e generais, os nobres e lordes detrás deles, todos eles  pouco se importavam. Ele reconhecia a ambição em seus rostos. A ânsia de poder. Enquanto cada um olhava para o corpo do rei, ele sentia que cada um se perguntava quem seria o próximo a tomar o trono.

Esse era o mesmo pensamento que Gareth estava tendo. O que aconteceria no rescaldo de um assassinato tão caótico? Se ele tivesse sido bem executado e a culpa recaísse sobre alguém mais, então o plano de Gareth teria sido perfeito – o trono pertenceria a ele. Depois de tudo, ele era o primogênito legítimo. Seu pai tinha cedido o poder a Gwendolyn, no entanto ninguém estava presente naquele momento, exceto seus irmãos, e os desejos de seu pai nunca tinham sido ratificados. Gareth conhecia bem o Conselho e sabia que eles levavam as leis muito a sério. Sem a ratificação, sua irmã não poderia governar.

Tal fato, novamente, conduziria a ele. Se o devido processo seguia seu curso – e Gareth estava determinado a fazer tudo o que fosse possível para isso – então ele teria de assumir o trono. Essa era a lei.

Seus irmãos lutariam contra ele, ele não tinha nenhuma dúvida disso. Eles evocariam o encontro com seu pai e provavelmente insistiriam para que Gwendolyn reinasse. Kendrick não tentaria tomar o poder para si – ele tinha o coração bom demais para isso. Godfrey era apático. Reece era jovem demais. Gwendolyn era sua única ameaça real. No entanto Gareth estava otimista: ele não achava que o Conselho estivesse pronto para uma mulher – muito menos para ver uma jovem adolescente governando o Reino. Sem a ratificação do rei, ele tinha a desculpa perfeita para passá-la por alto.

A única verdadeira ameaça que permanecia na mente de Gareth era Kendrick. Afinal, ele, Gareth, era odiado por todos, enquanto Kendrick era benquisto entre os homens comuns, entre os soldados. Dadas as circunstâncias, havia sempre a possibilidade de que o Conselho concedesse o trono a Kendrick. Quanto mais rápido Gareth assumisse o poder, mais rápido ele poderia usar seus poderes para neutralizar Kendrick.

Gareth sentiu um puxão em sua mão e olhou para baixo para ver a corda atada queimando a palma da mão. Ele percebeu que haviam começado a baixar o caixão do seu pai. Ele olhou e viu seus outros irmãos, assim como ele, cada um segurava uma corda e baixava-a lentamente. A corda de Gareth pendeu, já que ele se atrasou ao baixá-la e ele estendeu a outra mão e a agarrou até finalmente endireitá-la. Era irônico: mesmo após a morte, ele não podia satisfazer seu pai.

Os sinos dobraram Г  distГўncia, o som vinha do castelo, Argon deu um passo Г  frente e levantou a mГЈo.

“Itso ominus domi ko resepia…”

A linguagem perdida do Anel, a linguagem real usada por seus antepassados por milhares de anos. Era a linguagem que os tutores de Gareth haviam ensinado repetitivamente para ele quando era um garoto – ela seria necessária quando ele assumisse seus poderes reais.

Argon parou de repente, olhou em volta e fitou diretamente Gareth. Ele sentiu um calafrio atravessar sua espinha quando os olhos translГєcidos de Argon pareciam queimГЎ-lo por dentro. O rosto de Gareth ficou vermelho e ele se perguntava se o reino inteiro o estaria observando, se alguГ©m sabia o que isso significava. Com aquele olhar, ele sentia que Argon sabia que ele estava implicado. E ainda assim, Argon era misterioso, sempre se recusava a envolver-se nas voltas e reviravoltas do destino humano. Ele ficaria calado?

“O rei MacGil era um rei justo e bom.” Argon disse lentamente com sua voz profunda e sobrenatural.

“Ele trouxe orgulho e honra aos seus ancestrais, riquezas e paz para este reino como nenhum outro que  tenhamos conhecido. Sua vida foi tirada prematuramente, que Deus a tenha. Porém ele nos deixou um legado profundo e rico. Agora cabe a nós cumprir esse legado.”

Argon fez uma pausa.

“Nosso Reino do Anel está cercado por ameaças profundas e opressivas por todos os lados. Além do nosso Canyon, separados apenas por nosso escudo de energia, encontra-se uma nação de selvagens e criaturas que nos despedaçariam. Dentro de nosso  Anel, em frente a nossas Terras Altas, as Highlands, encontra-se um clã capaz de nos causar dano. Nós vivemos uma paz e prosperidade inigualável, ainda assim, nossa segurança é fugaz.

“Por que os deuses tiram alguém de nós no seu auge – um rei bom, sábio e justo? Por que era o seu destino ser assassinado dessa maneira? Nós todos somos apenas peões, marionetes nas mãos do destino. Mesmo no auge do nosso poder, nós podemos acabar debaixo da terra. A questão de real importância para nós não deve ser: pelo que nós nos esforçamos – mas  sim, que classe de pessoa nós nos esforçamos para ser.”

Argon baixou sua cabeça e Gareth sentiu suas mãos queimando enquanto baixavam o ataúde, o qual  finalmente alcançou o chão com um baque.

“NÃO!” ouviu-se um grito estridente.

Era Gwendolyn. HistГ©rica, ela correu para a borda da cova como se fosse atirar-se por ela; Reece correu Г  frente e agarrou-a, trazendo-a de volta. Kendrick se aproximou para ajudar.

Mas Gareth não sentia nenhuma compaixão por ela, ao invés disso, ele se sentia ameaçado. Se ela queria estar debaixo da terra, ele podia dar um jeito nisso.

Sim, realmente ele podia.


*

Thor estava de pГ© a apenas alguns metros do corpo do Rei MacGil observando-o enquanto o desciam atГ© a terra, sentindo-se oprimido diante dessa visГЈo. O rei tinha escolhido um lugar espetacular para ser enterrado, um lugar tГЈo alto, que parecia chegar Г s prГіprias nuvens, situado Г  beira do precipГ­cio mais alto do reino. As nuvens estavam tingidas de laranja, verde, amarelo e rosa, com os primeiros raios do sol nascente abrindo seu caminho no mais alto do cГ©u. Mas o dia estava coberto por uma nГ©voa que nГЈo iria levantar, como se o prГіprio reino estivesse de luto. Krohn, ao lado de Thor, choramingou.

Thor ouviu um grito e olhou para cima para ver Estopheles, voando em círculos no alto, olhando para eles ali embaixo. Thor ainda estava entorpecido, ele mal podia acreditar nos acontecimentos dos últimos dias; acreditar que ele estava ali naquele momento, no meio da família do rei, vendo aquele homem a quem ele tinha aprendido a amar tão rapidamente, ser sepultado. Isso parecia impossível. Ele mal havia começado a conhecê-lo, o primeiro homem que tinha sido como um pai de verdade e agora ele estava sendo levado embora. Mais do que tudo, Thor não conseguia parar de pensar nas palavras finais do rei:

VocГЄ nГЈo Г© igual aos demais. VocГЄ Г© especial. AtГ© que vocГЄ compreenda quem realmente Г©, o nosso reino nunca poderГЎ descansar em paz.

O que o rei tinha querido dizer com aquilo? Quem era ele exatamente? De que maneira ele era especial? Como o rei sabia? O que o destino do reino tinha a ver com Thor? O rei havia estado simplesmente delirando?

HГЎ uma grande terra, muito longe daqui. Muito alГ©m do ImpГ©rio. AlГ©m atГ© mesmo da Terra dos DragГµes. Г‰ a Terra dos Druidas. O lugar de onde sua mГЈe proveio. VocГЄ deve ir lГЎ para procurar as respostas.

Como MacGil sabia sobre sua mãe? Como ele soube onde ela morava? E que tipo de respostas ela teria? Thor sempre supôs que ela estivesse morta – a ideia de que ela poderia estar viva o eletrizava. Ele sentia-se determinado, mais do que nunca, a procurá-la, a encontrá-la. Para encontrar as respostas, para descobrir quem ele era e por que ele era especial.

Quando um sino tocou e o cadáver de MacGil começou a baixar, Thor se perguntou sobre as voltas e reviravoltas cruéis do destino: por que ele tinha o poder de prever o futuro, para ver este grande homem morto – e ainda permanecer impotente para fazer qualquer coisa a respeito disso? De certa forma, ele desejava nunca ter visto nada disso, nunca ter sabido de antemão o que iria acontecer; ele gostaria de ter sido apenas um espectador inocente como o resto, desejava apenas ter acordado um dia para saber que o rei estava morto. Agora ele se sentia como se fosse uma parte disso. De alguma forma, ele se sentia culpado, como se ele pudesse ter feito algo mais.

Thor se perguntou o que aconteceria com o reino agora. Era um reino sem rei. Quem iria reinar? Seria Gareth, como todos especulavam? Thor nГЈo poderia imaginar nada pior.

Thor perscrutou a multidão e viu os rostos severos dos nobres e lordes reunidos ali, provenientes de todos os cantos do Anel. Ele sabia que eram homens poderosos, pelo que Reece havia lhe dito, em um reino agitado. Ele não podia deixar de pensar sobre quem poderia ser o assassino. Todos aqueles rostos pareciam suspeitos. Todos aqueles homens estariam disputando o poder. Será que o reino seria dividido? Será que haveria desacordo entre suas forças? Qual seria o seu próprio destino? E o que dizer da Legião? Será que seria dissolvida? O exército seria dissolvido? Será que o Exército Prata se revoltaria se Gareth fosse nomeado rei?

Afinal, depois de tudo o que tinha acontecido, será que os outros realmente acreditariam que Thor era inocente? Ele seria forçado a regressar a sua aldeia? Ele esperava que não. Ele amava tudo o que havia conquistado, desejava mais que tudo permanecer ali, em seu lugar, na Legião. Ele só queria que tudo fosse como era antes, não queria que nada tivesse mudado. Há apenas poucos dias, o reino parecia tão substancial, tão permanente; parecia que MacGil permaneceria no trono para sempre. Se algo tão seguro, tão estável de repente poderia desmoronar-se, que esperança podia haver para o resto deles? Thor sentia que nada na vida jamais seria permanente.

O coração de Thor partiu enquanto observava Gwendolyn tentar saltar para o túmulo junto ao seu pai. Quando Reece a deteve, os servos se aproximaram e começaram a lançar pás do monte de terra para a cova enquanto Argon continuava seu canto cerimonial. Uma nuvem cruzou o céu, apagando o primeiro sol por um momento e Thor sentiu o rápido açoite de um vento frio, naquele  dia cálido de verão. Ele ouviu um ganido e olhou para baixo para ver Krohn aos seus pés, olhando-o.

Thor jГЎ nГЈo sabia o que seria de mais nada, mas ele sabia de uma coisa: ele tinha de falar com Gwen. Ele tinha de dizer a ela o quanto ele estava pesaroso e perturbado ele tambГ©m estava pela morte de seu pai, queria dizer-lhe que ela nГЈo estava sozinha. Mesmo que ela decidisse nunca mais vГЄ-lo novamente, Thor tinha de fazer com que ela soubesse que ele tinha sido falsamente acusado; que ele nГЈo tinha feito nada naquele bordel. Ele precisava de uma chance, apenas uma chance, para endireitar os assuntos entre os dois, antes que ela o dispensasse de uma vez por todas.

A multidГЈo foi se dispersando enquanto a Гєltima pГЎ de terra era jogada sobre o rei e os sinos dobravam uma e outra vez: filas de pessoas se estendiam atГ© onde Thor podia ver, contornando seu caminho ao longo da falГ©sia, cada um segurando uma Гєnica rosa negra, fazendo fila para passar pelo monte de terra fresca que marcava o tГєmulo do rei. Thor deu um passo adiante, ajoelhou-se e colocou a rosa na pilha que jГЎ estava crescendo. Krohn choramingava.

Quando a multidão começou a se dispersar e as pessoas começaram a circular em todas as direções, Thor notou quando Gwendolyn se libertou das mãos de Reece e correu histérica, para longe do túmulo.

“Gwen!” Reece exclamou indo atrás dela.

PorГ©m ela estava inconsolГЎvel. Ela atravessou a multidГЈo apinhada e desceu por uma trilha poeirenta ao longo da borda do penhasco. Thor nГЈo pГґde aguentar vГЄ-la naquele estado. Ele devia tentar falar com ela.

Thor, seguido por Krohn, irrompeu pela multidão espessa, abrindo seu caminho, tentando seguir o rastro de Gwendolyn e alcançá-la. Finalmente, ele conseguiu sair das proximidades e a viu correndo, bem longe dos outros.

“Gwendolyn!” Ele gritou bem alto.

Ela continuou correndo e Thor corria atrГЎs dela, dobrando a velocidade, Krohn grunhindo ao lado dele. Thor corria mais e mais rГЎpido, atГ© sentir que seus pulmГµes queimavam, quando finalmente, ele conseguiu diminuir a distГўncia entre eles.




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